O movimento é uma iniciativa do Instituto de Estudos da Religião (ISER)
Cerca de 250 pessoas entre lideranças religiosas, movimentos sociais, coletivos e comunidades de fé se reuniram para a abertura do movimento Vigílias Pela Terra, na Orla do Guaíba, em Porto Alegre, no último sábado (17/05). O encontro promoveu intervenções artísticas por meio do diálogo inter-religioso e teve como objetivo viabilizar articulações a partir de grupos religiosos para fortalecer ações no enfrentamento à crise climática. O movimento também realizou um memorial às vítimas da enchente no Rio Grande do Sul, ocorrida em maio de 2024. Ao longo do ano, as Vigílias Pela Terra vão acontecer nas cinco regiões do Brasil, em diferentes cidades, sendo Rio de Janeiro, Manaus, Recife e Natal, terminando com uma vigília de múltiplas tradições espirituais e sociais durante a COP 30, em Belém, que será no âmbito do Tapiri Ecumênico e Inter-religioso COP 30. A mobilização é uma iniciativa do Fé no Clima, do Instituto de Estudos da Religião (ISER).
Durante o ato em Porto Alegre, diversas lideranças religiosas estiveram presentes. Dentre elas, algumas fizeram discursos e intervenções artísticas em defesa da Terra, como a Cacica Iracema, indígena da Retomada Gãh Ré, o Pai Dejair de Ogum, Bianca Pedemonte, representante da Fé Bahai, Tiago Santos, do Coletivo Abrigo, a Monja Kokai Eckert, do Zen Budismo, a Irmã Claudete Rissini, católica da Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo (Scalabrinianas), o Pastor Olmiro Ribeiro Júnior, da Igreja Evangélica de Confissão Luterana e o Lama Padma Samten, da Comunidade Budista Tibetana. Além da participação de movimentos de catadoras e grupos socioambientais. No final da tarde, na orla do Guaíba, próxima a Usina do Gasômeto e ao monumento em homenagem aos voluntários que atuaram na enchente, manifestantes entoaram o mantra: “Tudo está interligado como se fossemos um”.
O articulador do ISER Paulo Sampaio enfatiza a importância de iniciar as Vigílias Pela Terra em Porto Alegre, um ano após a tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul, que deixou cerca de 79 mil pessoas desabrigadas. “Juntamos nossas vozes desde o Bioma Pampa, que se conecta com a Mata Atlântica e o sistema costeiro-marinho, em memória às vítimas das enchentes de maio de 2024. Situação que ainda não foi superada completamente, pois muita gente segue em abrigos na espera de política pública que atenda suas demandas por direitos. Este espaço também é um grito por justiça, não enfrentamos todos a mesma crise. Sentimos os impactos da crise climática de forma diversa. O racismo que provoca a intolerância, invasão e violação de terreiros é o mesmo que faz com que populações pretas e periféricas e as comunidades tradicionais sejam as mais afetadas pelos eventos climáticos”, pondera.
A ação foi co-organizada em parceria com o Fórum Inter-religioso e Ecumênico do Rio Grande do Sul (FIRE), a Fundação Luterana de Diaconia, o Coletivo Abrigo, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), o Zen Budismo do Vale dos Sinos, o Centro de Estudos Budistas Bodisatva (CEBB), a Visão Mundial, a Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, o Conselho Estadual do Povo de Terreiro do Estado do Rio Grande do Sul, o Youth Action Hub, o Global Shapers POA, Instituto Zen Maitreya-Zendo Diamante, Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN), Youth Action Hub da ONU, Curicaca, Nación Pachamama, Pastoral da Juventude Estudantil, Programa de Gênero e Religião da Faculdade EST, Comitê de Povos e Comunidades Tradicionais dos Pampas, dentre outras entidades e personalidades.
Em junho de 1992, o ISER realizou a Vigília Inter-religiosa ‘Um Novo Dia para a Terra’, em defesa do meio ambiente. O encontro aconteceu no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, no contexto da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92). Durante 12 horas, cerca de 30 mil pessoas e 300 lideranças religiosas se reuniram e realizaram celebrações de 25 tradições religiosas e espirituais diferentes. A mobilização deu origem ao Movimento Inter-Religioso (MIR-RJ) e resultou no documentário ‘Uma Noite Pela Terra’, dirigido por João Moreira Salles, disponível no canal do Youtube do ISER.
A celebração foi encerrada com uma meditação conduzida pelo Lama Samten, recitando o mantra de Tara. Ao comentar sobre os mais de 30 anos que separam os dois eventos sobre o clima realizado no país, Samten afirma que de lá para cá, muitas palavras foram derramadas mas quase pouco foi feito efetivamente. “A novidade que a gente teve de lá para cá é que nós estamos nos conscientizando que as palavras não são suficientes. Porque nós entendemos todas as coisas, mas a humanidade segue impulsionada de um modo destrutivo. A vigília é quando a gente abre o coração, pede que as coisas milagrosamente aconteçam. A racionalidade, ela já produziu todas as palavras, nós precisamos agora das transformações”, ressaltou.
O diretor adjunto do ISER, Clemir Fernandes, entende ser fundamental que as religiões façam parte do enfrentamento à crise climática a partir de suas próprias práticas de fé. “Em 1992 a vigília foi um diferencial político e espiritual na luta ambiental. Mais de três décadas depois, as religiões e tradições espirituais podem aportar um despertamento ético fundamental para que tomadores de decisão sejam ousados e eficazes no cumprimento de metas para interromper a curva ascendente da grave crise climática atual”, reforça.
Para a Coordenadora de Meio Ambiente e Religião do ISER Isabel Pereira, a COP 30 vem sendo considerada um marco mundial fundamental para o enfrentamento da crescente crise climática. “Apesar das limitações dos avanços por meio das negociações durante a conferência, temos a oportunidade de fazer o tema chegar a mais pessoas. A população precisa estar convencida da necessidade de enfrentar esta crise e do potencial transformador que sua mobilização pode causar neste cenário, especialmente considerando seus territórios e agendas locais”, pondera.
Em 2025, a 30ª edição da COP do Clima será realizada pela primeira vez no Brasil, em Belém do Pará, na Amazônia brasileira. A conferência reunirá líderes mundiais, cientistas, organizações não governamentais e representantes da sociedade civil para discutir ações que combatam as mudanças climáticas, proponham políticas públicas de justiça climática, apresentem inovações tecnológicas e de financiamento para adaptação e mitigação dessa crise e mais.